Avião que caiu em Piracicaba e deixou 7 mortos carregava excesso de peso e houve descuido com velocidade, diz relatório do Cenipa

  • 19/02/2025
(Foto: Reprodução)
Documento aponta possível manobra equivocada antes do acidente, ocorrido em 2021. Cenipa fez recomendação à Anac sobre reciclagem de profissionais. Avião caiu em Piracicaba (SP) na manhã de terça-feira (14) PAULO RICARDO/FUTURA PRESS/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO O avião que caiu em Piracicaba (SP), em 14 de setembro de 2021, deixando sete mortos, carregava excesso de peso, houve descuido dos pilotos com a velocidade e uma manobra pode ter dado início à perda de controle. É o que aponta o relatório final do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), divulgado nesta semana e interpretado por especialistas ouvidos pelo g1. LEIA MAIS: Queda do avião ocorreu 15 segundos após decolagem Quem são os 7 mortos no acidente de avião em Piracicaba Vídeo mostra desespero de pessoas no aeroporto ao ver queda 'A gente não acreditou no que estava vendo', conta testemunha Aeronave tinha histórico de reparos em hélices, diz relatório Na aeronave estavam o empresário Celso Silveira Mello Filho e sua família, além de piloto e copiloto. Ela decolou do Aeródromo de Piracicaba com destino ao Aeródromo Fazenda Tarumã, em Santa Maria das Barreiras (PA). Após a decolagem, o avião caiu em uma área de vegetação, após apresentar um movimento conhecido na aviação como estol. "O avião exige velocidade para manter a sustentação voando. E ele tem uma velocidade mínima onde ele vai perder a sustentação, ele não vai conseguir manter o voo. O estol é a perda de velocidade abaixo do mínimo que ele precisa para manter a sustentação e manter o voo", explica o perito e especialista em acidentes aéreos Roberto Peterka. Circuito de segurança grava momento em que avião cai em área de mata de Piracicaba Excesso de peso Segundo o relatório, o avião operava com 623 quilos acima do peso máximo. "Foram utilizadas as velocidades e parâmetros de uma decolagem típica, reduzindo-se a potência pouco após o recolhimento do trem. Nesse contexto, não ocorreu a avaliação adequada dos parâmetros de voo, culminando com a condição de estol da aeronave", aponta trecho da conclusão do documento. Segundo Peterka, os 623 quilos a mais são relevantes para as decisões de voo com esse tipo de aeronave. "Ele [piloto] precisaria de um pouco mais de velocidade para decolar [acima do peso] porque ele estaria exigindo maior esforço das hélices, que é a tração. Primeiro que ele não deveria decolar com excesso de peso. Mas, como ele decolou, o que eles dizem no relatório é que ele precisaria aumentar a velocidade na pista para poder sair. Ou seja, no linguajar da aviação, ele tirou o avião mole. O avião não tinha a sustentação adequada. Vejam que eram 600 e tantos quilos a mais. Para esse avião é relevante, sim", analisa Peterka. Imagens mostram desespero de pessoas ao ver avião cair em Piracicaba Rotação maior em hélice e velocidade reduzida A investigação identificou que a hélice esquerda estava operando a uma rotação por minuto (RPM) mais alta em comparação à hélice direita. Focados nisso, os pilotos teriam descuidado da velocidade. "No voo da ocorrência [do acidente], a tripulação fixou-se no excesso de rotações por minuto (RPM), não tendo notado, em tempo hábil, que a velocidade se reduzia, fato que limitou a possibilidade de se reagir tempestivamente à condição de estol", diz trecho da conclusão do relatório. O documento traz análise da condição de percepção dos pilotos diante da situação. "A condição de estol, provavelmente relacionada à gradual redução de velocidade que se seguiu à redução dos manetes de potência, não foi percebida em tempo hábil para que pudesse ser projetada uma reação. Naquele contexto, houve a percepção exclusivamente da condição de RPM da hélice ligeiramente excessivo". Acidente aéreo mata sete pessoas em Piracicaba Professor de engenharia aeronáutica da Universidade de São Paulo (USP) em São Carlos, James Waterhouse também chama a atenção para um descuido do piloto neste momento. "Eles [pilotos] ouviram uma variação de ruído na hélice e o piloto interpretou como um disparo de hélice. Foi um aumento [de rotação da hélice] considerado pelo relatório dentro da faixa normal, ainda não passivo de classificação como realmente disparo. Em função disso, o piloto acabou descuidando da velocidade do avião. Ele descuidou da velocidade, não prestou atenção, ele ficou muito focado na hélice e o avião começou a entrar no fenômeno chamado estol", explica Waterhouse. Manobra pode ter dado início à perda de controle O professor acrescenta que o piloto optou, de maneira equivocada, por realizar uma manobra conhecida como embandeiramento ou passo bandeira da hélice. Ele explica que isso significa reduzir a velocidade da hélice e avalia que foi o fator que mais contribuiu para o acidente. "Primeiro, ele interpretou um disparo [da hélice], coisa que de fato não era. Era só um aumento normal de rotação. Segundo, ele reduziu a velocidade da hélice porque por muito tempo ele voou com um avião bandeirante que tinha como procedimento, em caso de disparo de hélice, reduzir o passo [rotação]. E ele o fez, só que colocou na posição de passo bandeira, que é quando a hélice fica sem nenhuma tração. E nisso daí o avião já estava em estol, que é uma velocidade baixa, o fenômeno que acontece quando o avião mais precisa de motor", detalha. "Um possível comandamento do embandeiramento dessa hélice pode ter dado início à perda de controle da aeronave", diz trecho do relatório do Cenipa. Peterka faz uma comparação para explicar o desequilíbrio entre as rotações das hélices: "Quando você tem dois motores, imagina dois remadores. Um remador da esquerda rema, rema, rema e o da direita não rema. O que vai acontecer? O remador da esquerda vai fazer com que o barquinho vire para a direita. E foi o que aconteceu: o passo da hélice bandeira deixou de ter tração e o outro motor teve excesso de velocidade. Ele [avião] girou. [...] Se inclina muito, perde toda a sustentação e vem para o chão". Arte G1 Sem indícios de falha mecânica, diz especialista Com base nas análises do relatório, Waterhouse também afirma que não foram identificados indícios de falha mecânica. "Todos os sistemas foram retirados dos destroços e foram analisados em bancada e nenhum dos sistemas foi constatado defeito. Imaginava-se nesse acidente que havia tido um problema mecânico e esse problema mecânico, de acordo com o relatório, ele não pôde ser constatado em nenhum dos ensaios. Não existe nenhuma evidência de que algum dos componentes estivesse com defeito", completa. Recomendação de reciclagem de pilotos Segundo o Cenipa, o relatório é voltado a prevenir outros acidentes futuros. Na conclusão, foi recomendado à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) mudança no protocolo para reciclagem de pilotos deste modelo de aeronave, uma vez que houve mudanças em normatizações sobre esse avião. Ao g1, a Anac informou que recebeu o documento e, nos devidos prazos processuais, analisará as recomendações para avaliar as medidas cabíveis. Vítimas do acidente aéreo em Piracicaba Reprodução/ TV Globo Quem são as vítimas No avião estavam o empresário Celso Silveira Mello Filho e sua família, além de piloto e copiloto. Celso era acionista da usina Raízen Cosan. Era irmão do presidente do Conselho de Administração da companhia, o bilionário Rubens Ometto Silveira Mello. A Cosan, da qual a Raízen é subsidiária, é uma das maiores produtoras e processadoras de cana-de-açúcar e uma das maiores produtoras de etanol do mundo. Veja quem são as vítimas: Celso Silveira Mello Filho, 73 anos Maria Luiza Meneghel, 71 anos Celso Meneghel Silveira Mello, 46 anos Camila Meneghel Silveira Mello Zanforlin, 48 anos Fernando Meneghel Silveira Mello, 46 anos Piloto: Celso Elias Carloni, 39 anos Copiloto: Giovanni Dedini Gullo, 24 anos Entenda o que ocorreu ponto a ponto O empresário Celso Silveira Mello Filho, sua esposa, três filhos, piloto e copiloto partiram pouco antes das 9h do Aeroporto de Piracicaba. A viagem teria como destino o Pará, para uma fazenda da família, onde passariam uma semana. O avião caiu 15 segundos após a decolagem, em uma área de mata próxima à Faculdade de Tecnologia (Fatec) da cidade. O Corpo de Bombeiros foi acionado e no local encontrou as sete vítimas já mortas, carbonizadas. O Cenipa e a Polícia Civil foram acionados para realizar as investigações sobre a causa do acidente. No local, equipes localizaram a caixa preta do avião, onde o histórico de voo é armazenado. Ela foi analisada para produção do relatório final. Destroços do avião também foram recolhidos e foram analisados pelo Cenipa. De acordo com a FAB, a documentação e manutenção da aeronave estavam em dia. O avião foi fabricado em 2019 e é considerado de alta versatilidade por especialista. A última manutenção foi realizada em 23 de agosto. O retorno da oficina ocorreu na véspera do acidente. Veja reportagem completa sobre o acidente e as investigações no Jornal da EPTV 2ª Edição VÍDEOS: queda de avião em Piracicaba Veja mais notícias da região no G1 Piracicaba Veja mais notícias da região no G1 Piracicaba

FONTE: https://g1.globo.com/sp/piracicaba-regiao/noticia/2025/02/19/aviao-que-caiu-em-piracicaba-e-deixou-7-mortos-carregava-excesso-de-peso-e-teve-variacoes-nas-rotacoes-das-helices-diz-relatorio-do-cenipa.ghtml


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